Crescer é árduo. Juergen König sabe bem. Faz tempo que deixou de brincar com os irmãos no balcão da Livraria Alemã. O espaço virou negócio. Assunto sério. Tão sério a ponto de ele decidir fechar a loja, na Rua Amadeu da Luz. Fechar para que os negócios da família continuem a crescer. Mesmo que seja árduo.
Foi a decisão mais difícil da minha vida desabafa.
Foi mesmo. A livraria presente há 58 anos em Blumenau era negócio, sim. Mas não era só isso. Era uma família. Uma tradição. Um lar. Se na infância brincava de vender livros, quando adulto tomava café à tarde, encontrava conhecidos. Depois de um ano de dúvidas, a emoção deu lugar à razão. Há três meses, a terceira e a quarta gerações dos König, Juergen e o filho Stephan, decidiram fechar as portas da loja até o final do mês. O foco de pai e filho será agora a Editora Todo Livro, negócio em expansão na Rua das Missões.
Tudo bem, pensou Juergen. Tantas lojas fecham diariamente, não é? Não. A notícia correu a cidade, causando alvoroço. Duas escolas fizeram abaixo-assinados. Senhoras e senhores acostumados a comprar livros em alemão se sentiram órfãos. Gente de todas as partes da cidade, há duas semanas, se acotovelam entre estantes, comprando livros.
A notícia do fechamento desencadeou uma verdadeira ânsia por compras. Os mais afobados chegavam antes mesmo da abertura da loja, às 9h. Outros preferiam ficar até mais tarde. Teve quem saiu de lá só às 22h. Em uma semana de promoção, com descontos de até 60%, o auxiliar administrativo Elio Selhorst estima que foi vendido 90% do material de papelaria. Das 200 mochilas escolares, por exemplo, semana passada só restavam quatro. E os livros, bem, estes aos poucos iam desaparecendo em cestinhas abarrotadas, deixando estantes bagunçadas ou vazias. Nos dias de maiores movimentos passaram mais de 600 pessoas no local.
"Parecia um enterro", resumiu uma das clientes
Em meio ao tumulto, antigos e novos clientes se espremeram na livraria. Se alguns estavam felizes pelos descontos em livros e cadernos, outros estavam descontentes com o fechamento.
Durante a liquidação, me senti como em um enterro. Vi a tristeza dos jovens que freqüentavam o local conta uma conhecida da família desde a década de 1940, que preferiu não se identificar.
De acordo com a supervisora Elis Regina Voigt, quem tem mais dificuldade de compreender o fechamento são os idosos. Cerca de 20 descendentes de imigrantes, que ainda preservavam uma forte relação com a língua germânica, perderão o lugar que, no passado, foi referência em livros em alemão. Pelo tempo que freqüentavam o lugar, se sentiam em casa, sentavam, tomavam café. Agora, terão de reinventar seus dias.
Ramos de trabalho se modificam, clientes se renovam. A mudança está em curso e não olha para trás. Nem tanto. Juergen ainda sonha. Não descarta a possibilidade de abrir, um dia, quando não estiver mais na Todo Livro, uma livraria. Se a margem de lucro é pequena, nada se compara ao prazer que o produto proporciona e do agradável público que o busca.
wania@santa.com.br
WANIA BITTENCOURTJORNAL DE SANTA CATARINA
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